Mãe de primeira viagem
- Cartografias Subjetivas
- 24 de jul. de 2020
- 3 min de leitura
Numa sala de aula da faculdade de comunicação, em meados dos anos 2000, numa brincadeirinha de menina-moça, decido o nome do meu futuro filho. Ainda não namoro, muito menos sou casada e quem dirá grávida, mas, já sei que meu primeiro filho será do sexo masculino e já tenho o nome dele.
Passados alguns anos, me caso, engravido e no primeiro ultrassom o médico me dá a noticia que estou gravida de uma linda menina. Uau!!! Que máximo! Mas, como assim? E o meu filho? Aquele que eu já escolhi o nome?
Uma “pulga atrás da orelha”, não estou totalmente convencida, peço para fazer outro ultrassom, o médico me olha como se eu fosse louca e não me deixa fazer, ainda me deixa com culpa, diz que não precisamos fazer ultrassom para ver o que já vimos e que fazer ultrassom desnecessário causaria mal ao feto. - Nasce uma mãe, nasce uma culpa. - Meu médico já se encarregou de “regar” a minha.
Passo mais 2 meses aguardando a data do outro ultrassom e finalmente chega a tão esperada data. Como quem não quer nada, no momento em que estamos fazendo o morfológico, pergunto o sexo do bebê e para a minha surpresa, não é uma menina! E sim um menino. E o mais cômico ou triste é que o mesmo médico diz que desde o começo ele afirmou que era um menino. Posso brigar com ele? Ou devo ficar feliz em saber que minha intuição de mãe não estava errada e que meu filho está muito bem? Decidi ficar feliz e curtir cada momento da minha gestação.
Coloquei música para o meu filho ouvir na barriga, conversei com ele todas as noites, fiz aula de Yoga, treinei respiração, me preparei para um parto normal, arrumei o quarto, fiz o enxoval, curti cada minuto da magia que é a ligação uterina mãe-filho.
Uma semana antes do nascimento vem a notícia: ele está muito pequeno, minha placenta atinge grau 3, ou seja, não está mais nutrindo o meu filho e precisamos tirá-lo da barriga. Mas, não gostaria de uma cesárea, sonhei tanto com parto normal, estudei os inúmeros benefícios para nós dois. Aquele mesmo médico (do ultrassom) me diz: vou te induzir para o parto normal, mas, se não nascer em 3 horas, partiremos para uma cesárea.
Lá fui eu para um parto normal agendado, passei o caminho inteiro conectada ao meu filho e ao que seria melhor pra ele, estava apavorada o médico me disse que ele estava muito pequeno e me colocou medo. - Nasce uma mãe, nasce um medo. - E eu só queria tê-lo em meus braços saudável, inteiro, vivo. Rezei, chorei, pedi e entrei em trabalho de parto com a ajuda da oxitocina (hormônio que induz o parto), para acelerar o procedimento não podia tomar anestesia, pois ela inibe as contrações, vamos sem anestesia, o importante é ter dilatação. Passada 2h30 já tinha toda a dilatação necessária, tomei a anestesia e fomos para a sala do parto.
As lágrimas correndo pelos meus olhos e meu coração acelerado num mix de sentimentos e emoções: ansiedade, medo, felicidade, dor entre outros. Vêm as contrações fortes, faço força, me concentro na respiração e nas minhas aulas de Yoga, ouço o médico pegando o fórceps e vejo meu filho na mão do médico, na hora um nó se forma na minha garganta, meu filho está azul, roxo, será que ele está vivo? Por que ninguém fala comigo? Esse longo momento durou apenas 5 segundos, que provavelmente foram os 5 segundos mais longos da minha vida.
Ele nasceu ótimo! Ganhou nota máxima! E a cor azul? Ah! Era o médico esperando para cortar o cordão umbilical e sem oxigênio ele fica azul. Para que e por que deveriam contar isso para uma mãe de primeira viagem antes do parto? As mães, a subjetividade do paciente é colocada em segundo plano, desde que tenha saúde e esteja bem, o médico acredita ter concluído com êxito o seu trabalho.
Ah!! Outra novidade: o meu filho não nasceu pequeno, a cabeça estava tão encaixada que as medições foram erradas, erro de ultrassom. Só mais uma pequena infelicidade que me apavorou.

Não existe nada mais forte, vital que o amor de mãe, é um amor que transborda o ser, é estar conectada com sua cria para o resto da vida, é vivenciar um amor que dói de tão forte.
Muito provavelmente, por estar imersa nesse amor infinito que qualquer “falha” nos médicos me apavorava. Mesmo sabendo que eles estavam fazendo o que era certo e que tudo foi um sucesso.
Galah Dymetman Sanz
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