top of page

Mea culpa, meia culpa, mãe culpa

  • Cartografias Subjetivas
  • 5 de nov. de 2020
  • 2 min de leitura

Conta-me minha mãe que, ao se saber grávida de mim, chorou. Chorou porque naquele momento em sua vida, sentia-se incapaz de lidar com mais uma criança trabalhosa. Entendo o recado da culpa dela, claro. No entanto ela , ao dar à luz, deu a mim e à minha “gêmea”, a culpa.

A culpa sempre foi minha força de atrito estático: de um lado, força e coragem, de outro, culpa, culpa, culpa. Eu nunca havia entendido com clareza, que minha maneira de olhar para a vida, era através das lentes da culpa.

Eu vivia precisando “me culpar” para reconhecer e aceitar que eu era uma pessoa sensível, alguém que se importa com os outros e ser, enfim, o que a minha mãe não é.

A culpa servia para que eu a culpasse, já que ela não o fazia, já que a insensibilidade dela sempre transitou livremente.

Minha vida lado a lado, ombro a ombro com a culpa, sempre paralisou-me. Impedia-me ser filha, irmã, amiga, namorada, mãe, profissional – ou qualquer outro engajamento – de forma livre. E isto foi sempre um empecilho para eu desfrutar de mim mesma e, a vida, muitas vezes, parecia ser ruim, pesada e difícil.

Era como se nada pudesse realmente me fazer feliz, ou era como se eu nunca fosse conseguir encontrar “meu lugar” no mundo.

Sempre estive em contato com todas as minhas vontades e os meus desejos, embora não me permitisse realizá-los, colocando uma barreira à frente deles, o muro, a construção que eu fazia do Outro em mim.

Ora, o que iriam pensar de mim os meus pais se eu lhes pedisse ajuda? Não podia expressar fragilidade, não podia demonstrar ser um fracasso! Não, de jeito nenhum!

O que diria de mim meu namorado, se eu falasse, de repente, do nada, que eu quero que moremos junto? Ele com certeza pensaria que eu ‘tô’ pressionando!

E, não seria eu a pior mãe do mundo se dissesse ao meu filho que “agora não quero brincar”, quero deitar no sofá e ficar assim, sem fazer nada!?

No dia em que me dei conta de que a maior lição que eu deveria aprender com a minha mãe era sobre a falta de liberdade, resolvi libertar-me.

Então, soltei nossas mãos dadas - da culpa e minhas - e deixei-a ir embora. Nossa! Que alívio! A vida parece outra, o mundo parece outro, e eu, também.

Para minha surpresa, a sensibilidade, a leveza, continuam ainda aqui comigo, só o peso é que foi embora.

Ganhei a força de ser quem sou.

Apropriar-me da minha liberdade permitiu-me libertar - da culpa - também as pessoas a quem amo.


Thamires Fiorentino Jarra

 
 
 

Comments


  • Instagram - Black Circle
  • Facebook - Black Circle

©2020 por Cartografias da Subjetividade. Orgulhosamente criado com Wix.com

bottom of page