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A poesia levou

  • Cartografias Subjetivas
  • 1 de set. de 2020
  • 2 min de leitura

Aqui, agora. As tartarugas estáticas como pedras e o inverno ainda insiste em derrubar algumas folhas no chão do quase setembro. Os pássaros cantam e voam para lá e para cá em busca dos seus e de alimento. Aliás, em verdade, quem sabe o que os pássaros podem querer? Desconfio que seja muito mais simples do que o sentido que o éter poético, por vezes, tenta desvendar ou inventar.


Aqui, agora e cá estou. As tartarugas mergulharam na água. Eu mergulhei no ar que balança as árvores e me perdi de mim. Um poema atingiu-me como uma lufada. É preciso esvaziar-se para ler ou ouvir a poesia. É preciso esquecer-se de si por um momento e ir viver um poema. Respirar fundo o poema. Deixar os versos, o ritmo, a entonação e o coração do poema atingirem também o seu coração. E te preencher.


Aqui, agora. As tartarugas retornam para as pedras. Tinham saído para nadar um pouco. São 12:15 e faz calor, apesar da frente fria que pousa aqui por São Paulo neste final de inverno. Quando chega a primavera? Anunciada para, no hemisfério sul, dia 22 de setembro, ela só começa mesmo quando o vento frio do sul para de insistir em chegar e quando o vento quente do nosso litoral ganha força para cobrir nosso território com o vento fresco que parece carregar o amor.


Aqui, agora. As tartarugas mergulharam de novo nas águas. Com dificuldade, uma vai subindo e retornando, claro, a passos de tartaruga subindo em pedra molhada. O som da água caindo na água, dos pássaros cantando, dos carros passando pra lá do jardim, das pessoas conversando tranquilas do outro lado do lago, o vento fresco que harpeia pela minha pele e pelos vãos do meu cabelo...tudo isso fica querendo fazer a poesia nascer em mim. Eu deixo. Mergulho no ar que balança as árvores e me perco de mim, outra vez.



É preciso esquecer-se de si por um momento para deixar a poesia nascer. É preciso deixar os olhos puros, a pele exposta, os ouvidos sintonizados, o coração aberto e a boca fechada. O poema nasce no silêncio em nós. No dentro quieto que não são as entranhas, mas pode ser - e que não é o coração, mas pode ser.


A poesia é quem dá cheiros, ritmo e tom para o momento. Atingindo o aqui e o agora com a força de um lugar no qual você não precisa estar, pois ela te leva até lá - às vezes sem convidar. “Poesia é voar fora da asa”, disse Manoel. Eu concordo. Ler é coisa de gente que queria saber voar. Escrever também.


A gente nunca sabe bem pra onde vai. Gostoso é se deixar levar - e aproveitar o vento, a vista e as vestes que a poesia que te coloca.


Busquei as tartarugas para encerrar o texto, mas não as encontrei. Acho que a poesia levou.


Maria Luiza Soci Rehder


 
 
 

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